Especialmente em momentos de crise, empreendedores tendem a querer encontrar inovações que poderão ajudar o seu negócio a se manter vivo no mercado. Contudo, esse pode não ser o caminho. Inovações demandam tempo e investimento, além de apresentarem risco de falhas. O atalho pode estar mesmo é em olhar para dentro do próprio negócio.

Essa visão é defendida por Carmelo Queiroz, Head of People and Operations na Fanatee, uma das maiores empresas de games do Brasil. Ele é o convidado do oitavo episódio do Digicast, em que discutimos a importância de back to basics, ou seja, focar nas premissas básicas de negócio.


Para ouvir a oitava edição do Digicast, basta usar o player acima. Se preferir, você pode ler a transcrição da entrevista feita por Pedro Renan, CEO da Digilandia, logo abaixo.


Olá! Bem-vindos ao oitavo episódio do Digicast! Sou Pedro Renan, CEO da Digilandia e da Agência Papoca, e seu host. Hoje, trago um tópico muito relevante que é
Back to Basics, lições básicas de negócio. E, às vezes, fazer o básico é extremamente difícil. Pode ter certeza disso.

Para falar disso, recebo meu eterno sócio Carmelo Queiroz, da Fanatee, uma das maiores empresas de games do Brasil. Seja muito bem-vindo, Carmelo!

Obrigado, Pedro. É muito bom estar aqui com vocês, poder trocar experiências, ainda mais com o Pedro, meu eterno sócio, como ele falou. Temos uma história bem legal.

Recentemente, você fez um texto que achei muito pertinente para o momento atual que vivemos, de Covid-19 e quarentena. Você fez várias provocações em relação à necessidade constante de empreendedores quererem toda hora inovar, inventar a roda, mas esquecendo de fazer o básico, que é nosso tópico. Por que isso acontece na prática?

Primeiro, por falta de experiência e filtro. Existe um excesso de informação no mercado.  desejo de fazer algumas estratégias e encurtar alguns caminhos gera certa ansiedade.

Muito das estratégias que mais dão certo para os negócios existem há anos, anos e anos. E um excesso de informações, principalmente de empresas que colocam conceitos adicionais ali, faz com que seja criada uma camada e deixe um pouco mais nublado. 

O desafio é tirar toda a fumaça que existe e back to basics. Quais são as premissas básicas da minha estrutura de vendas? Quais são as premissas básicas que geram receita para o meu negócio? Quais são as premissas básicas que geram tração ao meu negócio?

E outra coisa é relativizar o que é inovar. As pessoas costumam olhar muito para fora do negócio para tentar definir os próximos passos, o que eu não estou dizendo que é errado, mas, muitas vezes, o próximo passo é que tem de ser o próximo pino de um conjunto de boliche. Qual é o próximo potencial? 

Muitas vezes, pelo menos pela experiência que tive, as oportunidades estavam dentro do negócio, olhando o básico, convivendo com a estrutura do negócio, se fazendo as perguntas difíceis do negócio, procurando a próxima oportunidade. Qual é o próximo pacote a ser criado para o usuário? Qual é o próximo conjunto de serviços que você entrega?

Olhando para dentro, é muito mais fácil ser mais eficiente no seu processo de abrir mercado do que, necessariamente, inovando. Inovar é caro, leva tempo e você vai falhar durante o processo.

Uma coisa que vejo que acontece muito é que muitas empresas não fizeram nem o básico, sequer têm um produto definido, um time estruturado, uma cultura definida e já querem criar outro produto, ir para outro mercado e criar nova estratégia. Sendo que aquela que é a principal e o produto que banca a empresa, elas não conseguiram resolver ainda.

Concordo. O cara não achou o product market fit. Se ele está procurando outro mercado é porque o business que ele tem não para em pé. O problema dele está muito antes isso, porque foi compondo toda a estrutura em volta de algo que não para em pé. Se tivesse preocupado em passos antes a entender as premissas básicas… Qual o delta do meu negócio? Qual o mínimo para me atender? Como sou enxuto o bastante para conseguir entregar valor? Como consigo entender que meu negócio para em pé? 

Se você olha estruturalmente para o seu negócio buscando as premissas básicas, que são custo menor que receita de operar e tenho lucro ou, potencialmente, no mercado de startup, o que é muito comum, consigo ver meu delta mais equilibrado um pouco mais à frente, porque tenho business potencialmente sustentável.

Muitos business não são sustentáveis estruturalmente e a ansiedade de fazer isso acontecer atropela etapas ou vai se atrás de capital excessivo para conseguir resolver o problema durante o processo.

No podcast 2, com o Alan da Phidata, e no 5, com o Thiago da My Metric, falamos especificamente de cultura data driven, de decisões baseadas em Analytics, de decisões baseadas em dados. Se você quer inovar ou fazer o básico, é preciso ter dados. Não dá para fazer isso somente no feeling.

No texto, você deu várias dicas. Recomendo todo mundo ler. Se pudesse dar cinco dicas principais, quais seriam?

O primeiro é contratação. Empreendedor é especialista em criar as melhores desculpas para justificar erros, porque a gente que está comandando. Somos especialistas em justificar nossos próprios erros.

Parte dos empreendedores contrata mal, pensando em curto prazo ou hard skills. Mas, normalmente, as pessoas saem da empresa por causa de soft skills. A pessoa não consegue se desenvolver ou não está atrelada à cultura.

Se você tiver um processo de contratação muito mais estruturado, com muito mais cuidado… Escuto muito empreendedor falar que é difícil formar a equipe. Você está fazendo o básico, que é trazer as pessoas certas que compõem o seu time e tiram esse peso e que tem tesão de desenvolvê-los continuamente? Se não está, você está fazendo errado. A premissa básica é trazer a pessoa certa. 

Finanças. As pessoas são treinadas na faculdade ou qualquer curso a gerenciar a parte financeira de forma contábil, com entrada e saída num período. E você pode ter visão muito mais estratégica do financeiro no sentido de em como ganha fluxo de caixa, como consegue usar o ROI potencial de dois ou três meses para fazer a antecipação de recebíveis para poder escalar mais rápido. Como consigo negociar novos contratos para pagar com dois meses e ter fluxo de caixa para antecipar meu processo de escala.

Você pode “brincar” no seu financeiro, para conseguir usar estrategicamente as finanças, para financiar seu negócio. Poucas startups fazem isso. Poucos negócios fazem isso bem feito.

Se você não controla seu funil de marketing e seu funil de vendas, você não tem business. Obviamente, todo negócio quer controlar e tem o desafio de desenvolver e controlar. Mas, na prática, se você não consegue enxergar a lógica estrutural e não consegue otimizar continuamente, você depende muito de variáveis orgânicas e seu business é limitado em curto prazo. 

Atendimento é a área que as pessoas mais pecam em fazer bem feito. Acho que as pessoas se enganam muito. Se nunca atendeu seu cliente, você não tem bom atendimento.

Se não vê constantemente e-mails que seus clientes têm, você não tem com atendimento. Se as pessoas da sua empresa não sabem os problemas que seu cliente tem, você não tem bom atendimento. 

Para mim, atendimento bem feito de verdade é cultura, tem de estar dentro do negócio. Na prática, no começo, você não terá o melhor serviço ou produto, mas, em médio prazo, uma construção de bom atendimento levará à construção de algo sustentável. 

Por último, o back to the basics simples, que é um grito. Olhe as premissas básicas. Olhe para dentro do seu negócio. Veja o que é simples. Pegue os dados mais simples do seu negócio e cascateie na sua estrutura. Esqueça soluções mágicas. Isso não existe.

Há pontos muito importantes. Esse do financeiro como estratégico pode ser decisivo para muitos negócios não quebrarem ou conseguir alavancar sem dinheiro externo. Nós fizemos isso.

Para quem não conhece nossa história. Estudamos juntos na faculdade, fundamos a Logovia, que era um marketplace de design gráfico em 2011, em Fortaleza. 

Depois, viemos para São Paulo, e o business tinha uma particularidade: o cliente pagava, de dois a sete dias, e eu só precisava pagar a outra parte da ponta 30 dias depois. Ou seja, tenho 28 dias, em média, de dinheiro no meu caixa do cara que me pagou. Eu tenho de repassar, mas tenho 28 dias. 

Normalmente, as empresas deixam o dinheiro parado. Têm medo de arriscar ou não querem entrar no fluxo de caixa. Nesses 28 dias, na soma do volume, isso pode dar milhares ou milhões, depende do tamanho da empresa. Mas você pode colocar para render, o que é básico, ou colocar para alavancar em mídia, estratégia de marketing, que trará mais clientes e, consequentemente, mais fluxo de caixa. Assim, não será preciso investidor. 

É óbvio que isso não é uma conta tão simples de ser feita, mas o ponto aqui é pensar macro. Se tenho algo de diferente no meu modelo de negócios, como me aproveito disso? Nem que seja um dia de rendimento, dois ou cinco. O ponto é como uso de maneira estratégia em vez de deixar na minha conta parado, sem fazer nada.

Fizemos várias pequenas estratégias. Se iríamos negociar contrato novo com algum canal, negociávamos e, na hora de fechar, pedíamos 60 dias, e o cara dava. Na prática, ganhávamos 60 dias do canal funcionando, entregando o resultado, tendo o payback esperado, para começar a pagar com o dinheiro que aquele canal nos trouxe.

Tínhamos 30 dias dos recebíveis, mais 60 dias da abertura de novo canal. O próprio negócio financiava o crescimento dele.

Por que aprendemos aquilo? Porque só tínhamos aquilo. Olhávamos para dentro do negócio, o mínimo de recursos viáveis, o back to the basics e fazia acontecer.

Normalmente, o que o mercado faria? Só falta dinheiro e vou atrás de investimento. Vai passar um ano e meio, sem olhar para o business, tentando vender um negócio que mal roda bem. Você criou uma desculpa mais rápido do que a solução, e nem entregou resultado para o negócio. Resultado para o negócio. Sempre.

Há uma frase muito famosa do Ray Dalio que é muito famosa. Não quero entrar no mérito se concordo ou não. Ele fala que “cash is trash”. No âmbito de startup, para a gente, foi muito valioso para aprendizado que conseguíamos ser muito mais criativos e inovadores quando não tínhamos dinheiro, porque precisávamos criar soluções mágicas, do que quando captamos investimento.

Esse é um ponto em que você faz a provocação de que todo mundo quer só captar o dinheiro, mas, ao captar, a facilidade de gastar de maneira ruim é muito maior. Agora que temos dinheiro, testamos tudo que sempre quisemos fazer. E a tendência é gastar muito dinheiro à toa, fazer estratégias que não funcionam e esquecer de focar no básico.

O lance aqui é mesmo que você tenha dinheiro, tente focar no simples, no básico e não gastar à toa. E busque dados para entender como fazer isso. O dinheiro nem sempre é a solução e, muitas vezes, pode ser um problema.

Normalmente, é também a primeira desculpa. Por que você não faz? Por causa do dinheiro.

Quando você tem dinheiro, normalmente, você vê que aquilo é, realmente, uma desculpa. Você não está atrás de acertar o tiro no cu da abelha. Você está atrás de trazer  a solução ideal.

Lembro de uma negociação clássica que fizemos que foi ao criar o site. Não tínhamos um programador. Esse é um erro. Se você vai criar uma startup, tenha um programador. Não tínhamos dinheiro e fomos em várias empresas. A que mais gostamos tinha o orçamento mais caro. O Carmelo começou a negociar e R$ 30 mil que seriam à vista viraram R$ 14 mil, com R$ 1 mil e outras 13 parcelas.

E a primeira parcela só depois que o site fosse entregue.

Ou seja, é um absurdo por completo. Como conseguimos isso? Não faço a menor ideia. Os caras aceitaram, entregaram o site, funcionou e tracionou depois.

Se tivéssemos R$ 500 mil em caixa, teríamos pago à vista, mas não teríamos o lastro de 14 meses de negociação.

O ponto é: se você tem dinheiro ou não, haja com austeridade.

Um outro ponto do texto é atendimento. No podcast 7, que fiz com o Marcus, da Pluga, eu contei que tive um problema de viagens e precisei cancelar minhas reservas. Com o Airbnb, fui muito bem atendido. Com as outras, não conseguia nem falar com a empresa. 

Aí, ele colocou uma provocação que achei muito legal. Ele questionou se o time de atendimento do Airbnb é melhor do que os das outras empresas ou as pessoas são tão capacitadas quanto e a empresa não tem a cultura de empoderar as pessoas para resolver os problemas. 

Com certeza, o segundo ponto. Não é relação com pessoas. É relação com cultura.

Para mim, atendimento é cultura de negócio. Numa empresa em que não há cultura de negócio, a função do atendimento é blindar o negócio dos problemas do usuário. Se o problema do cliente é resolvido no atendimento, está errado. O problema do cliente estrutural tem de ser resolvido dentro do negócio.

Se o atendimento não permeia na estrutura do negócio e não há uma comunicação clara dos founders e da liderança sobre sua importância, nunca vai permear. Sempre será um problema do atendimento. E atendimento, estruturalmente, carrega um peso do usuário e acaba tendo um turnover alto. 

Ou está dentro da cultura ou não é bom atendimento. Não acredito mais em atendimento bom que não esteja na cultura do negócio.

Apenas mais um ponto que lembrei sobre finanças. Quando fomos acelerados, tínhamos duas metas: break even da empresa ou pegar um investimento. Claramente, não iríamos pegar o investimento. A gente achava que pegaria. 

Depois, muito na frente, fechamos o investimento. E o investidor chegou para a gente e questionou o que foi uma das melhores coisas que tinham acontecido com a gente. Eu disse que tinha sido não pegar o investimento. 

Pós-aceleração, ao não ter pego, tivemos de limpar todas as estratégias megalomaníacas, olhar para dentro do negócio e gerir o negócio olhando os princípios básicos. Desde então, crescemos todo mês consistentemente.

Só um ponto para quem não está familiarizado com os termos. O que é hard skill e o que é soft skill? E por que erramos em contratarmos sem olhar soft skills?

Hard skill é habilidade técnica. O soft skill é habilidade não técnica, de interagir com as pessoas, de falar, de ser confiável ou qualquer outra habilidade que não é técnica.

Normalmente, quando um gestor vai contratar, ele pensa numa dor de curto prazo. Eu preciso de analista para cuidar as minhas tabelas. Ele tem uma dor e aquilo consome uma parte do tempo dele. 

Portanto, é muito fácil tentar encontrar candidato rápido, porque está doendo. Você tende a abstrair alguns problemas fora desse candidato que estão ligado a soft skills porque ele é bom de planilha. Eu trago esse cara.

Ele não está alinhado com a visão do negócio, não comprou a liderança, a nossa cultura. Mas minha visão de curto prazo é de que ele tem uma visão mais analítica e estrutural. Ele traz relatórios mais estruturados. tenho uma visão clara para ele de um ou dois anos, mas, na prática, ele não quer. Ele é um piloto de planilha.

Eu invisto meu tempo em desenvolvê-lo, aquilo me frustra como gestor, acabo não desenvolvendo mais e vou atrás de outra pessoa. Quem estava errado? Você. 

Contratar bem feito dá trabalho. Deve haver um processo minimamente estruturado para garantir que aquela pessoa está alinhada. E o mais difícil não é avaliar o técnico, é exatamente o soft.

E contratar é caro. Contratar errado é mais caro ainda. 

Carmelo, há uma pergunta difícil que faço aqui para todo mundo, para não ficarmos só em acertos, só em histórias bonitas. Empreendedorismo não é isso.

Se pegarmos tópico central de volta ao básico, qual foi o principal erro em não olhar para o básico?

Foram tantos erros em seguida que vou citar um período nosso da Logovia. Havia coisas básicas para crescer. Éramos muito eficientes, entregávamos resultados, éramos muito pragmáticos na gestão de negócios.

No momento em que pegamos investimentos e começamos a ter um conselho, esquecemos todas as premissas básicas que fizeram a gente crescer: estar próximo das pessoas, ser lean, focar no dia a dia, nas premissas básicas.

Começamos a trazer mais pessoas, a contratar errado, não ser mais tão eficiente nas coisas do dia a dia, parar de seguir uma linha lógica de crescimento e tentar crescer mais rápido do que conseguíamos. A gente pedalou muito até se achar novamente.

O período em que mais erramos foi exatamente quando me descolei das premissas básicas que me formaram como empreendedor, olhar o negócio como ele é e olhar a coluna vertebral dele o tempo inteiro.

Ali, dava para ser um podcast só de erros que tivemos um atrás do outro. Aquele período foi um MBA de formação empreendedora de erros que não deveríamos cometer mais. Iríamos falir por causa disso.

Com certeza. É o que falamos no começo. Quando deixa o dinheiro te iludir ou achar que o dinheiro é infinito e que não vai acabar, você se perde.

Falamos de erro. E acerto?

Citarei dois. Um foi na We Do Logos. No período que toquei vendas lá, foi um período em que eu abaixava a cabeça, sentava na mesa e construía nossa máquina o tempo inteiro. Meu foco era primeiro pessoa e depois processo. E todo dia afinando a máquina, com a paciência de aumentar tíquete, aumentar margem e mix.

Todo mês, definíamos uma estratégia clara, duas no máximo. Trabalhávamos um ou dois meses naquilo e melhorávamos. Consistentemente, conseguíamos melhorar nossas entregas. 

Na própria Fanatee, temo um desafio de ser um business global. Obviamente, ao olhar para o globo, você vê N oportunidades. Um dos desafios era aprender como escalar de um jeito lean. Escalamos de três para 11, 12 idiomas de um jeito extremamente estruturado, extremamente focado em menos de um ano em todos esses mercados adicionais.

Aprendemos a criar um modelo simples e a replicar esse modelo. Executamos aprendendo com os pequenos erros dentro do processo. Isso nos ajudou a crescer no mercado e é um grande valor que criamos para o negócio.

É muito grande. Você pegar um jogo que era português, inglês e espanhol e expandir em um ano para mais de 10 idiomas e atingir mais de 100 milhões de downloads. São 100 milhões de pessoas jogando.

É um jogo de palavra. É, literalmente, criar todo conteúdo do zero.

Posso fazer até outra pergunta baseada nessa questão do acerto é onde está o gap entre achar o modelo e replicar e bater cabeça? Obviamente, para replicar, bateram muita cabeça. Onde houve o ganho?

O conceito mais importante é a lógica. Eu poderia dizer que foi isso, isso e aquilo. E, na prática, não foi.

Se você voltar na timeline e colocar numa linha do tempo, somos fanáticos pelo produto. Temos três propostas na Fanatee: pessoas, produto e fazer o business crescer. Mais nada. Essas são nossas prioridades. 

Somos muito focados. Então quando olhamos para produto, queremos encontrar todas as potenciais oportunidades e vamos no detalhe do detalhe.

O conjunto do mindset de ter a estrutura de dados, de analisar o dado, de ter um fanatismo de reconhecer e quase emular a cabeça do usuário na relação dele com o produto, além de entender muito bem o ambiente em que estamos inseridos. Isso fez com que a gente afinasse continuamente para azeitar o modelo. Quando azeitamos o modelo, aí vira um jogo do delta. Quanto mais consigo aumentar meu delta?

No momento em que chegamos num ponto de equilíbrio e tínhamos várias oportunidades para azeitar esse delta, começamos a azeitar. Quando o delta estava confortável, escalávamos. 

Não tem bala de prata. É muito foco no BI (Business Intelligence), foco no usuário, o produto perfeito para o usuário e muito conhecimento de mercado. 

Se você fizer essas quatro variáveis com foco em limpar a fumaça e back to the basics, você achará a oportunidade ou simplesmente entenderá que seu produto não é bom. 

Às vezes, é importante você saber que seu produto não é bom, que sua empresa não é boa e vida que segue. Existe uma linha tênue entre resiliência e ser cabeça dura. Você tem de ser resiliente, batalhar, perseverar, mas tem hora que não adianta. Vida que segue e vai tocar outra coisa.

Neste momento em que gravamos, estamos no meio da quarentena. Há alguns mercados que estão em queda vertiginosa, mas games está voltando. Há muita gente baixando e jogando na quarentena. Eu comprei Banco Imobiliário, War, Detetive… Nos outros podcasts e aqui, falamos de dicas de como sair da crise. E quando está tudo bem? Quais estratégias vocês estão usando para maximizar o retorno?

Para falar a verdade, estamos com mais tesão de colocar o pé no acelerador. Podem surgir oportunidades, como competição menor em nível de campanha, fazer aquisição de usuário mais barato, há mais talentos no mercado. 

No ponto de vista de mercado, você pode aproveitar para dar um push, realinhar seu planejamento e tentar entender para onde o mercado está indo, para poder acelerar o máximo possível quando o negócio voltar. Num jogo de corrida, quem se mantém mais rápido em constância conseguirá levar. 

Para onde está indo o mercado e quais oportunidades pode trazer? Será que tem mais idosos jogando? Será que há mais jovens jogando? Quais variáveis podem mudar e como nos posicionamos para abraçar as oportunidades que podem surgir?

Para ser sincero, essa é uma discussão constante. Todos constroem cenários, mas ninguém sabe o que vai acontecer. Temos observado e acelerado nosso planejamento. 

Não mudou muito nossa variável. Para a gente, business as usual. Não mudou quase nada.

No podcast, sempre falamos muito de livro, de filme e série, para dar uma descontraída.  Qual dica de livro você traria?

O primeiro e número um é Jack definitivo, do Jack Welch. Sou fã de poucas pessoa, mas cada vez que estudo mais sobre o cara, viro mais fã.

Diferentemente do que já me venderam muito sobre o modelo de gestão do Jack Welsh, ele era um dos líderes globais mais focados em pessoas por performance.

As pessoas pegam as estratégias dele e dão muito ctrl+C e crtl+V nas lógicas, mas não entendem quais são as premissas nas variáveis dele. 

Jack Welsh era um gestor que vivia menos a política do negócio, que era mais back to  basics, performance e pessoas em primeiro lugar.

Se você pegar essa variável e aplicar em tudo que ele vende, verá que é genial. E os negócios são tanto jogo político que é muito difícil um CEO ter o pragmatismo que o Jack tinha em gerar eficiência para o negócio dele.

Livro Jack Definitivo

E o segundo foi um dos livros que mais me surpreendeu no ano passado que é do fundador de uma cervejaria chamada John Adams, que é Quench Your Own Thirst. Não sei porque tem relação com o tema de hoje. Ele é um cara formado em Harvard. A cervejaria já fez IPO. Mas o cara fala de negócio de uma forma muito simplista. Acho que é um desafio nosso ser simples do jeito que você entende seu negócio.

Uma métrica para olhar é que quanto mais complico minhas variáveis, mais preciso entender a simplicidade das lógicas. Ele dá uma grande lição de como olhar para o negócio dele de um jeito simples. E ainda é divertido.

Quench your own thirst

O Sonho Grande do Jorge Paulo Lemann trata muito disso também, como eles entravam em negócios com muito potencial, mas que claramente estavam mal gerenciados. Depois, a tendência era sempre crescer. É um livro muito bom também.

Tem uma fala do Beto Sicupira, que fala que se você trata, independentemente do tamanho do seu negócio, problemas grandes como problemas grandes, você terá soluções complexas.

Você tem alguma dica de filme ou série? 

Um filme que gosto muito é A Origem, e por motivos simples. Tenho uma mania de olhar um filme, por mais louco que ele seja, tentando desconstruir aquela lógica. Talvez seja por isso que não gosto de filme de ficção.

Em A Origem, a estrutura é tão bem construída, as formas como as camadas dos sonhos existem, como você acorda, que você se envolve tão profundamente. Há muitas lições naquele filme de composição, storytelling, composição, que acho vale pelo entretenimento e estudo de caso.


É uma coisa que acabo falando para todo mundo é que se olharmos aquilo com outra visão, ver a fotografia, a estratégia, os diálogos, conseguimos aprender com tanta coisa, porque nada está lá por acaso. Há um tanto de gente trabalhando para fazer o diálogo e, às vezes, nem prestamos atenção. 


Eu me lembrei de uma série que já vi umas cinco vezes, que é Gigantes da Indústria.

Conta a história de mega empreendedores dos Estados Unidos que inovaram no seu período, desde Rockefeller até J. P. Morgan. E o que acho mais foda é tirar o sapato de startupeiro, colocar o pé no chão, olhar para o básico e entender que inovação e business existem desde sempre. Não somos revolucionários e somos um negócio como qualquer outro. 

Talvez a função de uma startup número um é parar de ser uma startup o mais rápido possível e virar um business de verdade, faturar, pagar imposto, ter funcionário… Isso que é o tesão da história. Acho que é um belo tapa na cara para entendermos que inovação existe desde sempre. Para ser desbravador, existem N variáveis.


Escuto de vários amigos que um alguns jogos, como Angry Birds, são tão simples e fazem sucesso. Isso é difícil pra caramba e é tão difícil que a maioria das pessoas que criticam não consegue fazer porque não consegue emular. Não é só isso.


É um dos business mais complexos e sofisticados. Na prática, é um ambiente global, então você compete em high level. Há muitos detalhes, é 100% problem based

E cada jogo que você abre tem uma chance de dar errado. Entender o business do mercado de games é dificílimo. Por isso, há tão poucos que conseguem fazer bem. E, na prática, estamos aprendendo até hoje.

Tem algum blog que você acompanha e indicaria para o pessoal?

Não. Nenhum blog que vejo consistentemente para indicar. Tem um podcast que eu poderia indicar que é chamado How I Built This, que é minha novela. 

A coisa que tenho mais tesão é ver uma história verdadeira de um empreendedor, as dores, as dificuldades que ele teve, os momentos de dor e superação. E o How I Built This está mais preocupado com a história. Para mim, é uma novela. Eu choro, me divirto, rio. É minha série semanal. Recomendo fortemente.

É muito bom mesmo. Já falamos também do livro The Hard Thing About Hard Things, que, para mim, é o melhor livro de empreendedorismo que existe justamente por isso. Ele conta a realidade e o que de fato acontece. A capa da revista vem depois de muitos anos de histórias.

Ou a capa de revista vem depois de pagar caro nas relações públicos para vender a história de que um dia você será algo e as pessoas compram a receita de curto prazo do que você está vendendo. E essa é uma verdade dos fatos.

Tem isso também. Acontece diariamente. Outro podcast muito bom é o Masters of Scale. O Carmelo falou de choro e tem um episódio do Masters of Scale que conta a história do Slack em que eu chorava e soluçava, porque a história do cara era muito sofrida. 

Em Masters of Scale, eu chorei num que me marcou é que do Shake Shack.

Primeiro, Shake Shack é animal. É um puta de um podcast de experiência do usuário. Sobre atendimento, é a melhor aula que você pode ter. Esquece qualquer livro. Lê, anota e leva para a empresa.

O dono da Shake Shack queria ser advogado e estava se preparando para fazer a OAB, estava no jantar com a família dele e estava muito triste. O tio dele perguntou o motivo, e ele disse que faria o exame da OAB. E, sem pensar, verbalizou que não queria ser advogado.

Ele começa a comentar sobre aquela história. Eu estava escutando na rua e me lembrei do meu passado, que poderia ser esse cara. Resolvi seguir tudo o que as pessoas falaram para eu não seguir. E quando isso bateu na minha cabeça, comecei a chorar na rua. E pensei que bom que passei por tudo isso.

Esse episódio é muito bom, e Shake Shack é muito bom. Se você tiver oportunidade de comer, é muito bom.

Carmelo, tem alguma pergunta que não te fiz e você gostaria de frisar como mensagem para o pessoal?

Estamos falando um pouco de conhecimento e, talvez, uma das histórias que mais gosto de contar da gente foi quando descobrimos que éramos o maior problema da empresa.

Estávamos andando linearmente em faturamento, não conseguíamos mudar nossa receita. Passamos três, quatro horas numa sala de reunião discutindo o que iríamos fazer. 

Depois de três horas e meia em que não tínhamos mais a quem culpar, ficou um silêncio na sala. Ficamos nos olhando e eu falei que o problema era a gente. Começamos a discutir se deveríamos trazer alguém ou vender. 

Na discussão, havia claramente um olhar de tristeza e dor. Aí veio a fala que “se somos tão inexperientes, tão moleques e achamos que temos a capacidade de criar algo tão potencialmente escalável com tanta facilidade, isso prova que estamos completamente despreparados para fazer isso. O problema era acharmos melhor do que éramos. 

Começamos a ser viciados em estudo, em técnica, em networking e começamos a trocar. Passamos a parar de procurar Bíblia de vendas para procurar técnica de vendas. Paramos de procurar a revolução do marketing para entender como estruturamos um processo de marketing.

Quer aprender? Vai procurar o conteúdo difícil. É que nem malhar, é o que ajuda a fortalecer, para entender a lógica estrutural, montar uma biblioteca mental e tomar decisões mais inteligentes e lógicas.

Quando você pega dicas, não consegue ter a lógica por completo na cabeça e acha que vai plugar uma solução.

Eu nunca mais esqueci daquele dia e nunca posso me esquecer do que falta para eu ser melhor no que preciso melhorar.

Realmente, temos muita história. Se gostaram, mandem um e-mail para mim, que é pedro@digilandia.io. Mandem que eu posso pensar em outros temas para o Carmelo voltar mais na frente.

Uma última pergunta sobre o seu texto é que deveríamos voltar ao “barriga no balcão”. Se você pudesse explicar o que significa e por que o dono do barzinho da esquina tem muito a ensinar para a gente.

Meu pai costumava tomar cerveja numa mercearia. Como era pequeno e não bebia, eu ficava sentado e observando o dono. Hoje, pensando no ponto de vista do negócio, aquele cara cuidava das premissas básicas do negócio o tempo inteiro.

O cara estava na frente do negócio, estava sempre lá, conhecia o usuário de verdade. Na prática, conhecemos pouco o usuário. Eles gerem o negócio na ponta do lápis. Não direi que é muito eficiente do ponto de vista financeiro, mas eles reconhecem as finanças deles. Eles reconhecem o que o usuário querem e mudam rapidamente a composição de produtos. Eles experimentam facilmente. O cara testava numa bodega. 

Eles não tinham medo de errar, experimentavam continuamente. Eles procuravam o delta o tempo inteiro, estavam lá vivenciando aqui.

Se você está muito fora do negócio procurando investimento, se não entende as premissas básicas do negócio, não conhece o usuário no nível de emular o comportamento e a cabeça dele, volte passos e tente fazer isso.

Portanto, back to the basics, barriga no balcão, execute o melhor que puder, faça o básico bem que o resto virá.

No episódio 5 do Digicast, com o Thiago Morello, e no episódio 4, com o Rafael Damasceno, que são duas pessoas que trabalham muito com testes, eles falam que, ao emular o comportamento, o dono da empresa costuma dizer que não faz daquela forma. Não é sobre você, é sobre seu usuário.

Carmelo, agora o momento jabá, para você falar o que quiser, sobre a Fanatee, você…

A gente na Fanatee não é muito bom de se vender. Na prática, estamos crescendo, muito focados e temos muitas vagas abertas. Brincamos que não vamos vender sonhos, PPT, não queremos ser unicórnios. Estamos preocupados em fazer o business crescer, preocupados com as pessoas e com o produto.

Se você quer entrar num negócio real, em um negócio que para em pé, um business de verdade, com pessoas focadas em todo dia fazer o melhor que podem, mande seu currículo para a gente. Acesse fanatee.com.br. Teremos um processo um pouco chatinho, para garantir que temos os melhores talentos aqui.

Baixem nossos jogos, principalmente os dois maiores que temos, que são Stop, de adedanha, e CodyCross, que é um jogo de palavra cruzada.

Depois de lembrar-se da importância das lições básicas de negócio, confira também Empresas Digitais: você está pronto para viver essa realidade?